Estudo aponta a importância hídrica da área urbana que abriga mais de 36 nascentes e pode ser peça-chave na preservação do Velho Chico.
A Importância Hídrica da Mata da Bica, de Formosa para o Velho Chico
A Mata da Bica é uma Área Verde Urbana situada na zona central do município de Formosa-GO (Zona Urbana), inserida entre a malha viária e a rede de unidades residenciais e comerciais do seu entorno (Zona de Vizinhança). Com uma área de 256.800 m² e ainda sem delimitação oficial, a Mata necessita de regularização fundiária e carece de estudos mais específicos e aprofundados. Suas funções vão além das definidas pela antiga Lei Municipal nº 11/1948, que a protege pelas suas nascentes e por seu valor recreativo e de bem-estar social.

Apesar da ausência de delimitação formal, a área apresenta um bom estado de conservação de sua flora, composta por Cerrado stricto sensu, Mata de Galeria e Mata Ciliar, incluindo vegetações nativas e exóticas que desempenham papel essencial na preservação dos corpos hídricos da região, especialmente do Rio São Francisco. Sua fauna também é considerável, abrangendo mamíferos, aves, répteis, peixes e, provavelmente, outras espécies ainda não identificadas.
A Mata abriga mais de 36 nascentes, em uma superfície predominantemente plana com áreas de depressão, formando uma extensa região brejeira decretada como área de proteção ambiental. Historicamente, o local foi utilizado para exploração madeireira, banho, recreação e atividades domésticas como lavagem de roupas, antes de se tornar Parque Público.

O Parque Ecológico Municipal da Mata da Bica é o local de nascimento do Córrego Josefa Gomes, que abastece integralmente a Lagoa Feia. Esta, situada integralmente em Formosa-GO, está sob jurisdição compartilhada entre o município e o Exército Brasileiro. A Lagoa Feia, por sua vez, é considerada o berço do Rio Preto, que atravessa Goiás, o Distrito Federal e Minas Gerais. O Rio Preto é responsável por 25,3% da vazão do Rio Paracatu, um dos 10 principais afluentes do Rio São Francisco.

A importância da água como recurso vital é incontestável. No Parque Ecológico Municipal da Mata da Bica, a água tem sua origem em afloramentos, olhos d’água e minas que formam uma grande área alagadiça, alimentada por lençóis freáticos e pelo escoamento das chuvas provenientes de altitudes mais elevadas. Essa configuração dá origem ao Córrego Josefa Gomes, que se une aos corpos d’água da Lagoa Feia, do Rio Preto e do Rio Paracatu, até alcançar o São Francisco.
Contudo, ainda são escassos os estudos sobre a qualidade e o enquadramento das águas da Mata da Bica. Há indícios da redução da lâmina d’água da Lagoa Feia. Estudos mais detalhados sobre a microbacia do Córrego Josefa Gomes, o mapeamento das nascentes e corredeiras, a recomposição da Mata de Galeria e a aplicação efetiva de políticas de proteção ambiental são urgentes. É fundamental atender à Resolução CONAMA nº 357/2005 e outras legislações pertinentes.

As infrações ambientais nas áreas da Mata da Bica e da Lagoa Feia são evidentes. Diversas normas como o Estatuto da Cidade, a Lei de Crimes Ambientais, o Código Florestal, o Plano Diretor e a legislação do zoneamento urbano (ZUPA) não estão sendo plenamente cumpridas. A EMBRAPA (2008) já alertava para a crescente escassez de água doce e seus riscos para a saúde, nutrição e segurança alimentar, reforçando a importância da preservação hídrica.
A Agência Nacional de Águas (ANA) trata dos principais rios da Bacia do São Francisco em seu sistema de acompanhamento de reservatórios, mas não considera as nascentes da região brejeira da Mata da Bica, essenciais para a formação do Rio Preto. A operação de Usinas Hidrelétricas a fio d’água, como a UHE Queimado localizada no Rio Preto entre Goiás e Minas Gerais, depende diretamente de nascentes em altitudes elevadas e com vazão significativa — exatamente o que a região da Mata da Bica proporciona.

Ignorar esses contribuintes hídricos compromete a sustentabilidade do sistema. Documentos acadêmicos e institucionais frequentemente tratam equivocadamente a nascente na Serra da Canastra (MG) como o verdadeiro berço do São Francisco, desconsiderando as contribuições reais da Mata da Bica, do Córrego Josefa Gomes e da Lagoa Feia.
A CODEVASF também concentra seus esforços no médio e baixo São Francisco, negligenciando o alto curso e suas cabeceiras. Esses dados são fundamentais para a regulação e distribuição de recursos hídricos e energéticos, impactando diretamente o mercado de energia elétrica e o saneamento básico.
O critério técnico mais relevante para definir uma nascente-principal ou nascente-berço é a altitude. As nascentes da Mata da Bica e da Lagoa Feia possuem altitudes compatíveis — ou até superiores — às da Serra da Canastra e da Serra dos Ventos. Além disso, aspectos como controle da erosão, contenção vegetativa, prevenção de contaminação, uso racional da água, mudanças climáticas e ocupação humana devem ser levados em consideração.
Segundo a ONU (2022), cerca de 25% da população mundial não tem acesso à água potável. Essa realidade, aliada ao descaso com dados técnicos, fomenta conflitos regulatórios no saneamento e na preservação ambiental.
Portanto, este artigo tem como objetivo sensibilizar instituições como o Exército Brasileiro, ANA, ANEEL, CODEVASF, CBHSF, MMA/IBAMA-ICMBio e demais órgãos públicos sobre a importância de iniciar, com urgência, estudos aprofundados sobre a relevância hídrica da Mata da Bica, do Córrego Josefa Gomes e da Lagoa Feia. Reconhecê-los como o verdadeiro berço do imponente Rio São Francisco é essencial para garantir sua preservação e sobrevivência.
O autor. Por: Luiz Carlos Zytkuewisz, MSc Eng. Amb
Maio de 2023.
(versão revisada e atualizada)
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