Mata da Bica em Formosa: Descubra como um estudo detalhado revela a verdadeira origem do Rio São Francisco em Goiás. O plano de manejo aponta as nascentes da Mata da Bica como o ponto de partida do “Velho Chico”, desafiando a narrativa oficial. Leia o artigo completo.
- Por: Luiz Carlos Zytkuewisz, MSc. Eng. Amb
- Maio de 2023 (versão revisada e atualizada)
Mata da Bica em Formosa: o Berço Esquecido do Rio São Francisco?
O Plano de Manejo descreve o Parque Ecológico Municipal da Mata da Bica, em Formosa, Goiás, e indica ações para sua manutenção e uso adequado. Este plano, fundamental para a gestão da área, faz parte de um processo de Compensação Ambiental, um Termo de Compromisso (TCCA) firmado em 2020 entre uma empresa privada e a Prefeitura Municipal de Formosa-GO. A complexidade do manejo de um parque ecológico urbano exigiu uma equipe multidisciplinar, unindo conhecimento científico e ações práticas para garantir resultados efetivos na sua gestão.
O Parque da Mata da Bica: Um Patrimônio a Ser Protegido
Localizada na zona central de Formosa, a Mata da Bica é uma Área Verde Urbana (AVU) de 256.800 metros quadrados, rodeada por vias e áreas residenciais e comerciais. Mesmo sem uma delimitação oficial, a área já conta com a proteção da Lei Municipal 11/1948, que reconhece sua importância para a recreação e o bem-estar local, principalmente por suas nascentes.
Apesar de a flora (Cerrado Stricto Sensu, Mata de Galeria e Mata Ciliar) estar em bom estado de conservação, a área clama por estudos e ações mais pontuais. A fauna também é significativamente diversa, com mamíferos, aves, répteis, anfíbios e peixes, além de outros grupos ainda não identificados. Com uma topografia plana e algumas depressões, o parque abriga mais de 36 nascentes, formando uma vasta área brejeira que já foi usada para exploração madeireira e recreação, até se transformar em parque público.
A Conexão Vital: Da Mata da Bica ao Velho Chico
A Mata da Bica é o local de nascimento do Córrego Josefa Gomes, que abastece 100% da Lagoa Feia. A Lagoa Feia, por sua vez, é considerada o berço do Rio Preto.
O Rio Preto, que percorre Goiás, o Distrito Federal e Minas Gerais, é o principal afluente do Rio Paracatu, sendo responsável por 25,3% de sua vazão. Por fim, o Rio Paracatu, com uma vazão média de quase 500 m³/s, é um dos 10 principais afluentes do Rio São Francisco, o “Velho Chico”.
Essa cadeia hídrica mostra que a água é um recurso vital, cuja existência depende de um conjunto complexo de fatores, como a vegetação, os animais, o solo e a topografia. A água da Mata da Bica nasce de afloramentos e minas, formando uma área brejeira graças à depressão natural do terreno e ao escoamento das águas da chuva vindas das áreas mais elevadas.
A Urgência da Preservação e o Descaso com os Dados
Apesar de sua importância, a qualidade da água da Mata da Bica e sua real classificação ainda precisam ser estudadas. Há indícios da diminuição da lâmina d’água da Lagoa Feia, e a recomposição de partes da Mata de Galeria e a definição de normas mais rigorosas para as Áreas de Preservação Permanente (APP) são urgentes. A falta de respeito às normas ao redor da Mata da Bica e da Lagoa Feia é visível, contrariando leis como o Estatuto das Cidades, o Código Florestal e o Plano Diretor.
Isso nos leva a refletir sobre a afirmação da EMBRAPA (2008) de que a água doce se tornará a commodity do século, colocando em risco a saúde e a segurança alimentar. Curiosamente, a Agência Nacional de Águas (ANA) e a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (CODEVASF) negligenciam as águas da região de Formosa. A ANA não inclui as nascentes da Mata da Bica, o Córrego Josefa Gomes e a Lagoa Feia em seus esquemas de acompanhamento da Bacia do São Francisco. A CODEVASF, por sua vez, foca no médio e baixo São Francisco, ignorando a cabeceira do Rio Preto.
Essa falta de dados precisos afeta a alocação de recursos financeiros e a gestão hídrica, comprometendo a segurança da Bacia do Rio São Francisco. A altitude de uma nascente é um critério técnico fundamental para identificar a nascente-berço de um rio. As altitudes das nascentes da Mata da Bica são, em alguns casos, mais elevadas que as das nascentes da Serra da Canastra e da Serra dos Ventos, em Minas Gerais, frequentemente citadas como nascentes do São Francisco.
A Usina Hidrelétrica de Queimado, no Rio Preto, teve um dos melhores aproveitamentos em maio de 2023, o que não seria possível sem a contribuição da Lagoa Feia, abastecida pela Mata da Bica. Sem este “berço” hídrico, o futuro dos rios Preto, Paracatu e, por consequência, do próprio São Francisco, estaria comprometido.
Um Apelo à Consciência e à Ação
Com estas breves considerações, o artigo busca sensibilizar as autoridades e instituições — como o Exército Brasileiro, ANA, ANEEL, CODEVASF, CBHSF, MMA/IBAMA-ICMBio — para a inegável importância hídrica de Formosa. A Mata da Bica, o Córrego Josefa Gomes e a Lagoa Feia são o verdadeiro berço de um fluxo vital que alimenta um dos rios mais importantes do Brasil.
Estudos aprofundados são urgentemente necessários para manter o São Francisco vivo, garantindo sua perenidade e contribuindo para a segurança hídrica e ambiental de toda a bacia.